É espantoso como, em apenas um ano, a ciclovia da Avenida da República se tornou a mais movimentada da cidade de Lisboa. São dezenas ou até centenas as bicicletas que diariamente se vêem por lá, de um lado para o outro, principalmente às horas de ponta. Já é comum ver 3, 4, 5, 6 ou até mais acumuladas nos semáforos. Algumas delas são de mães a transportar os filhos na cadeirinha de trás, outras são de pais com a criançada em atrelados.
A bicicleta é um fenómeno em ascensão em Lisboa. O investimento da Câmara numa infra-estrutura ciclável cada vez maior e melhor, bem como a rede pública de bicicletas partilhadas que agora está a surgir, têm contribuído para este aumento de ciclistas na cidade, provando que as colinas são um mito ou, vá, um preconceito. Com iniciativas privadas como a Glovo e a UberEATS, as bicicletas em modo estafeta estão também por toda a parte.
Lisboa não é, nem será Amesterdão ou Copenhaga, mas pode também ser uma cidade ciclável. Infelizmente dados concretos não existem, porque não são contabilizados. Rosa Félix, investigadora do Instituto Superior Técnico, realizou um pequena contabilização há exactamente um ano, quando a ciclovia da Avenida da República estava ainda a ser estreada, no cruzamento com a via ciclável da Avenida Duque d’Ávila – entre as 8h30 e as 10h30 de 22 de Fevereiro, contou 174 bicicletas naquela intersecção. Hoje acredito serem muitas mais.
A Avenida da República é um percurso que faço todos os dias e, às horas de ir para o trabalho ou de regressar a casa, passo por muitos ciclistas e vejo outros tantos em fila no sinal vermelho, esperando pelo atravessamento dos carros. A grande maioria é respeitadora das regras de trânsito e os peões parecem também consciencializados do que é uma ciclovia, olhando para os dois lados antes de a atravessar ou circulando na beira. Pelo menos ali, na Avenida da República. A rede de bicicletas partilhadas – a Gira –, promovida pela Câmara e pela “filha” EMEL, parece estar a contribuir para o aumento do número de ciclistas – muitas das bicicletas que se vêem por aqueles lados são deste sistema.
Esta semana, curiosamente, apanhei um pai que trazia um atrelado duplo para transportar os seus pequenos. Bicicleta bem iluminada (“tem de ser”, disse), acabou por meter conversa comigo enquanto esperávamos num semáforo – outro ciclista à minha frente, seis do lado oposto. Perguntei-lhe há quanto tempo usava a bicicleta, disse-me que há vários antes. “Tenho escritórios em Entrecampos e na baixa, sempre fiz esse trajecto de bicicleta. Chamavam-me maluco na altura”, disse com uma boa disposição que lhe gabei.
Esta alegria foi, aliás, um dos motivos que me fez, há uns 2/3 anos, adoptar a bicicleta como meio de transporte. Sente-se a cidade de uma forma diferente, apanha-se a brisa de manhã e o pôr-do-Sol ao final do dia. Chega-se com outra disposição e espírito ao trabalho – bem diferente de sair de casa, entrar dentro de um túnel e sair só no local de trabalho. Não estou a dizer que a bicicleta pode ser para todos, porque não o é, nem nunca será. Mas é, sem dúvida, uma alternativa e, às vezes, só experimentando. Antes também era céptico – até com a questão das colinas. Depois percebi que muitos dos trajectos são relativamente plano e que, nem que seja dando uma volta ligeiramente maior, consegue-se circular sem grande esforço. A app Horizontal pode ser uma ajuda para definir os percursos.
Ainda muito vai mudar em Lisboa no que toca a bicicletas. A infra-estrutura ciclável vai crescer dos actuais 80 km para 200 km até 2020 e a primeira fase da rede da Gira estará concluída até Março. Algumas ciclovias vão ser reformuladas – ainda bem porque há muitos erros na cidade que causam conflitos desnecessários com automobilistas e peões. Mas há uma certeza que tenho agora: a bicicleta é um fenómeno em ascensão em Lisboa e curiosamente digo isto um dia depois de um estudo ridiculamente tendencioso do ACP (Automóvel Clube de Portugal) e que levou Carlos Barbosa, presidente daquele clube, a falar em “má gestão das cidades”, exemplificando que em Lisboa “foram retirados quilómetros de corredores BUS para instalar ciclovias que estão vazias” (o que é duplamente falso).
Por falar em estudos, partilho um bem mais sensato, da Rosa Félix. Quanto maior e mais diversa for a amostra, melhor. Por isso, é participar! Partilho também o blogue Lisbon Cycling que conheci há pouco tempo e que convidem quem tenha interesse neste tema a seguir.