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Porque saquei Sara

Sara é uma série do caraças. Muito provavelmente a melhor série portuguesa de 2018. É do mesmo realizador de São Jorge, Marco Martins, e conta, por isso, com um elenco que, para quem viu o filme, lhe será familiar – é o caso de José Raposo, Nuno Lopes ou Beatriz Batarda. Aliás, em Sara, Beatriz dá vida à protagonista, Sara Moreno, uma actriz que se vê forçada a fazer novelas porque só com o cinema não consegue pagar as contas. Sara acompanha as dificuldades de Sara Moreno a nível pessoal e profissional, mas, mais que isso, atravessa os meandros produção cinematográfica e televisiva portuguesa para traçar uma crítica ao formato de novela – do mesmo modo que O Último A Sair (tal como Sara, uma ideia de Bruno Nogueira) satirizou o formato de reality-show.

Sara é constituída por 8 episódios que têm entre 30 e 40 minutos cada; vistos de seguida – digo-vos, é muito difícil parar a meio –, dão um belíssimo filme de quatro horas. A série passou na RTP 2 no final de 2018 e está agora disponível na RTP Play – um serviço que prezo imenso; é fantástico a RTP Play existe, pois permite acesso a conteúdos que já passaram na televisão e que de outra forma estariam inacessíveis.

Contudo, Sara não ficará muito mais tempo na plataforma de streaming da RTP – só por mais 10-15 dias. Ou seja, depois disso passará a ser mais complicado ou impossível ver a série; tem de se esperar que ela passe novamente na televisão ou que voltem a disponibilizá-la algures. É recorrente ser difícil chegar a determinadas séries e filmes portugueses depois de estes percorrerem o habitual circuito de distribuição montado pela indústria: primeiro os conteúdos passam no cinema e/ou na televisão, com sorte repetem na grelha televisiva, e se calhar são editados em DVD.

Respeito os direitos de autor, mas não tive alternativa que não descarregar os 8 episódios de Sara (usei este site, btw). Primeiro, não sabia se ia conseguir ver a série toda antes dela desaparecer da RTP Play. Depois, o serviço de streaming da RTP não está disponível na televisão; ou seja, se não quisesse ver Sara no computador, teria de estar a ligá-lo por cabo à televisão… uma chatice! Assim, tendo os ficheiros, posso colocar numa pen ou fazer streaming para a Apple TV – bem mais prático.

Contudo, mais importante, tendo descarregado a série (são 5 GB), posso ficar com ela para se mais tarde quiser recordar. Não acho que o que fiz seja um problema, pois não tenciono publicar os episódios na net; é para consumo privado apenas ou para emprestar a um amigo como quem empresta um DVD. Mas há algum mal em gostar tanto de uma série e querer ficar com ela? Ou em partilhar esse entusiasmo?

O DVD é, ainda e muitas vezes, a única garantia de termos uma cópia sempre disponível de uma série ou filme do que gostámos. Mais: um DVD pode ser partilhado ou coleccionado para, mais tarde, mostrar aos nossos filhos – não é efêmero como uma plataforma de streaming que este mês pode ter o que queremos ver mas que a longo prazo não controlamos. Contudo, computadores com uma ranhura são já hoje uma raridade e leitores de DVD idem – imagine-se daqui a meia dúzia anos. Além disso, será que quero estar a acumular DVDs que só vou rever, talvez, algumas vezes? Ocupam espaço e não são propriamente as coisas mais amigas do ambiente.

Mas, se em vez de um DVD, pudesse descarregar as séries e os filmes de que gosto, guardar esses ficheiros “para sempre” num pequeno disco rígido de 1 ou 3 TB lá em casa… Criar a minha biblioteca privada – estilo iTunes. Sem depender de grelhas televisivas, de calendários de cinema ou de direitos negociados por plataformas de streaming. Poderia fazer o download quando me apetecesse, da mesma forma quem (em teoria) posso comprar um DVD quando me apetece. Um modelo em que os direitos de autor não impediriam o acesso das pessoas às boas obras produzidas na televisão e no cinema português – e, em alguns casos, financiadas com a taxa audiovisual.